12 de dez. de 2008

Aqui dentro, em mim, o ócio devora a preciosa transição que separa a noite da madrugada; lá fora, o mesmo ócio alia-se à escuridão, a devorar o fogo-fátuo dos postes de luz que tremem tristes no frio da rua, talvez tristes pelo ócio diário de esperar o dia nascer para poderem dormir, talvez frios por não poderem abraçar uns aos outros, separados pela distância fixa do cimento. Eu tenho o comodismo de escolher a hora em que a escuridão vem devorar meus olhos e encher meu corpo de sono, o vidro da janela e a luz das lâmpadas me asseguram isso enquanto deposito o restante dos meus pensamentos em blocos de notas. Feito isso, procrastinando noite (ou seria dia?) adentro, embalado pelas vozes de Omara e Bethânia misturando charutos Havana, coca, rum, gelo e limão com eme-pê-bê, samba, rumba e salsa, é que eu bebo o resto da água no copo, apago a luz e abro a janela, pedindo à brisa cheiro-de-mar para encher o mesmo copo de sonhos, pra que eu possa beber e finalmente dormir. Meus dias nunca têm vinte e quatro horas, isso seria muito normal pra mim. E ao som-de-fundo dos grilos e cigarras eu explodo a alegria, por vezes contida, com um assovio. Vou enterrar meus sonhos bem fundo dentro de mim, aguardar a hora em que terei que me mergulhar para buscá-los quando se realizarem (já fiz isso algumas vezes).

Dou boa noite às paredes e copos d'água, bons ouvintes nessas noites de ócio, companheiros inseparáveis nesses momentos em que se planeja a vida sem nada fazer.


(mas eu continuo sentindo pena dos postes de luz...)

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