17 de dez. de 2010

Lia, ali
Só, sozinha, a sós
Ou como queira chamar
Lia para si mesmo os versos
De um texto sem fim

"Ah, pobre leitora
Não sabes meu fim
Muito menos o teu"

Lia lia
Devagar, vagarosamente, aos poucos
Ou como queira dizer
Ali, no início ou no fim,
Nem ela nem o texto o sabiam

"Ah, estimada companheira
Pula uma parte ou outra
Pouca diferença há de fazer
Abre os braços
Deita no chão
Observa esse céu estrelado
Que não é meu nem teu"

Era noite
Cansou de ler
Pôs um 'fim' com tinta
E para sua surpresa
O texto, agora, ribombou
E enquanto ele falava
Uma escrita surgia no branco das páginas

"Não, agora não
Não pares
É cedo, ainda
E quanto mais cedo começares
Mais cedo terminas"

Ficou de pé num salto
E, com sobressalto
Viu o texto chacoalhar suas páginas

"Não me deixes!
Quando estavas só fui eu que te fiz companhia
Ali, você lia, Lia
Só, sozinha, a sós
Ou como queira chamar
Devagar, vagarosamente, aos poucos
Ou como queira dizer
Mas, Lia
Tu lias em mim sobre presente, passado e futuro
E agora queres me deixar aqui, só eu e o tempo?"

Fugiu, e tentou pedir socorro quando o texto a seguiu
Mas as palavras lhe fugiam
Como fugiam também do texto
Agarravam-na pelos pés
Puxavam seus cabelos
Entravam pelos ouvidos...

Minha avó dizia
Lê até o fim, minha filha
Não sabes o que acontece com quem abandona um texto pela metade?
Eu nunca acreditei no que ela dizia
Hoje eu moro na página setenta e três
E estou aqui, conversando contigo

Ah, pobre leitor(a)
Não sabes meu fim
Muito menos o teu
Pula uma parte ou outra
Pouca diferença há de fazer
Só não pares
Quanto mais cedo começares
Mais cedo terminas
E não me deixes!
Ou terás o mesmo fim que eu
Lia, a menina que lia
Só, sozinha, a sós
Ou como queira chamar.

8 de dez. de 2010

Tomando nota:

"Agora eu me expurgo de mim mesmo
Em busca do Outro em que me encarcero,
e é mais que horror o poço interno
em que eu sou duplo, quando não sou vário.

Onde eu sou blefe, onde sou sincero?
onde a costura no cetim-inferno,
se a cada ponto que no meu signo encerro
outro ponto esgarço, em sentido inverso?

Ah, Ser de angústia, Ser de desespero!

Terrível é o Deus que por esmero,
te criou assim para o degredo
de ser cúmplice de si próprio
e dublé de si mesmo."

6 de dez. de 2010

Uma das coisas que Raquel mais queria era voar.
E, sinceramente, do alto dos quase dois anos em que a gente esteve junto, eu já não sabia o que fazer, ou dizer. Lembrava das vezes em que ela me acompanhava ao violão, aquele canto doce e afinado. Eu a via quase todos os dias, depois do trabalho. Chegava em casa e ela já estava lá, me esperando, saracoteando dentro de si. Aquilo era felicidade.
De uns tempos pra cá, Raquel não tem cantado mais. Ou o faz com uma tristeza no canto que é de lágrima. Também já não me segue no tocar. Canta apenas só, quase em desafio, quase um lamento. E seu banzo me dá arrepios, como se me mantivesse prisioneiro, como se fizesse de mim mesmo uma clausura. Como se fossem os restos de minha alma grilhões, acorrentando-a ao meu desespero.
Na última vez que cheguei em casa procurei não fitar seus olhos. Ela já não mostrava aquele rebuliço de outrora. Passei direto. Mas foi aí que Raquel me surpreendeu, como ela o fez, quando nos conhecemos. Cantou. Sua voz, aquele silvo perfeito, não destoou sequer uma nota. Peguei o violão e a melodia se propagou. Eu chorei. Ela chorou. Nunca antes meus ouvidos tinham degustado tamanho banquete. Nunca antes olhei Raquel com o respeito com que agora eu a via.
Era de manhã já.
Me aproximei, meio indeciso.
Ela se aproximou, assim, incrédula.
A chave torceu no lugar. E foi quando eu a tive livre que a tive mais perto.
Uma das coisas que Raquel mais queria era voar.
O que eu mais queria era poder voar com ela.

1 de dez. de 2010

Eu gosto da madrugada
Traduzir o negro
Em cores que ninguém mais vê
Me parece tão utópico como real
Tudo é tão desigual
Aos olhos de quem lê
Bicho-papão é ogro
Que de papão não tem nada
Eu subo a escada, degrau de vidro
Desligo a tevê?
Só tem coisa imoral, o que é legal
É brincar de não ser
Chapéu de feltro
Arma carregada, carta marcada
-Que lindo bebê!
-Parece um etê...
Quem vem beber
Do meu licor?
Sinto uma dor, no âmago
No cerne, no meio
Da alma

Vem com calma...
Chama meu nome
No escuro
-Eu tô com fome
-Me faz cafuné
Canção de ninar
Depois vem deitar?
Tô tão insone, preciso rezar
Pra São Tomé
De Aquino?
De Pedro!
De João.
De Maria...

Virgem Maria!
Tua mão tá fria,
Amor...

Eu sei.
É o vento
É o sereno
Tempo da madrugada
De que tanto gosto.
Putz...

Eu chupando Trident de canela por cima de um céu de algodão-doce, ouvindo Hendrix e sua Purple Haze e observando um pôr-do-sol que eu nunca vou ver de lá de baixo; enquanto isso, tinha gente preocupada com turbulência.

Vai entender.

28 de nov. de 2010

Disseram
Vai
Deixa o que te aflige aqui
Ganha o céu

E sonha
Sonha por sobre as nuvens
E serás feliz

Disse eu
Moça
Eu já sou tão feliz
Hoje, aqui, agora
Que queria subir, voar bem alto
Dar umas voltas pra trás no mundo
Ganhar uns dias
!
Só pra reviver o presente

Que presente seria
Tomando nota:

"Sorrisos são pontes que se abrem no rosto para o outro poder passar. E só por conta daquele sorriso eu atravessei a distância entre o meu rosto e o dela para encostar meus lábios aos seus."

Faz tempo que não venho aqui. Agradeço aos leitores de sempre. Quanto aos nunca-leitores, recomendo que comecem pelo começo, ou seja, pelo final. O final-começo não tá dos melhores.

Clique AQUI para ir ao final.

Aos leitores de sempre e nunca-leitores, dedico o próximo texto, que aliás não é meu.
Trata-se de passagem de inestimável valor, de alguém que muito admiro pela simplicidade com que escreve e toca as pessoas.

Um abraço.

1 de out. de 2010

Faz falta
A lascívia
Libido
O ranço, o sebo
Chafurdar na lama
Feito porcos
Se refrescando ao meio-dia
Rijo, o membro
Suculenta, a carne
Faz falta
A pele
Tato
Os pêlos, as dobras
Insinuar-se nas curvas de um lençol
Feito corpos à meia-noite
Vivo, o sangue
A latejar nas têmporas
Gritos, feromônios
Cheiro do sexo
Coxas, virilhas
E tudo o mais
Que puderes imaginar

Em sonho
Querer é poder

28 de set. de 2010

-AAAAAAAAAAaaaaaaaaaaaaaaaaaah!
-Que é isso, rapaz!? Pirou de vez?
-É que, do nada, deu uma vontade louca de gritar...

25 de ago. de 2010

- Jão, qui merda é essa?! Pensei qui cê tava na lida, hômi! Tá fazeno o quê im casa essa hora, porra... Os minino chorando aí i você cantando, rapai?
- Tem qui cantá, amô. Os dia tão cada vêis mais difícil, né? Ó isso. É tudo o qui sobrô depois da fêra. Olhi qui num comprei muito, não. Capricha na farinha qui os trocado são pa cachaça, visse?. Comprei essas flô, murcha, tava na promoção... pa tu. Tem qui cantá, amô. Num si vive como antigamente, hã? A pressão hoje né dos milico, não. A moral é dos hômi dos morro, cum aqueles tal di fuzil acá, uzi banhada a ôro, lançadô di granada contra revórvi i peito di policial. Perdeu, perdeu. Tem qui cantá, amô. Como qui trabaia pa comprá o pão? Falta imprego pa mim, pa tu, pa disgramada da tua mãe. Vai faltá pros nosso filho, os coitado, que Ciço abençoe. Tem qui cantá, amô. Cadê educação? O povo mal sabe assiná o nomi. As criança tão cansada di isperá livro i arrois, cresci na basi do crack i prostituição. Olhi qui só o qui tem é puta fazeno dinhero i eu aqui liso. Só os dotô por aí falano qui os minino é o futuro do país, aham... Tem qui cantá, amô. Nem nos funcionário di Deus vali a pena confiá mai, muié! Cuida po Pedim num andá dando o
caneco presses fila da puta, vissi? Tem qui cantá, amô. Depois disso tudo qui eu falei, a saúde di nóis tá uma bosta danada. Onde nóis si trata? Diz qui os ricurso tão si multiplicando pra saúdi, mais o qui multiplica é fila. Os posto daqui perto tão tudo sem médico. Morri genti nos corredô dos hospitar sem sê atendido. Tem qui cantá, amô. Num vê esses viado qui a gente confia? Vão tudo si abrindo pra Brasília. Magote di corno, só servi pa inchê as rôpa cum dinhêro da genti. Ninguém vê o que aconteci cum nóis não, muié. Tem mermo é qui cantar, porra. Num vê as música de hoje em dia, não? Essas pôrra di forró eletrônico é virado num traqui até na terra do forró tradicioná, pé di serra. Sem falá nessas banda lá dos sul, cum os diabo si rebolando, tudo a merma merda. Tem que cantá, caraio! Causo qui a voz da genti si acaba reclamano i nada muda nesse furico di país. Vô gastá o resto cantano. Si quisé, sobrô o triango, aí cum o Valmi. Si não, vá pa casa do caraio, i quando vortá trais umas cerveja, qui po lá devi di tá bem mió qui aqui.

23 de ago. de 2010

O desamor
Em seis passos escrevi
Ela se foi
Restam as lágrimas
As lágrimas não mais
Os olhos permanecem
Se forem os olhos?
O cheiro fica
Vai-se o cheiro
Mas não a lembrança dele
Perdida a lembrança
É derradeiro o desejo
Sem desejo, não mais existo.

E pensar que, em um só passo de dança, fez-se o amor.

17 de ago. de 2010

Tava no computador curtindo um reggaezinho na boa e a Jaqueline veio com aquela conversa de que queria discutir a relação e tudo o mais. Fingi não ouvir e ela ficou puta da vida. Tomei um tapa tão miserável que o fone caiu e, ainda assim, continuei ouvindo música nos meus ouvidos. Como dizia uma prima minha, Jah proverá.

10 de ago. de 2010

Injetei no braço esquerdo, logo depois da curvinha do cotovelo, como me mandaram fazer. Trinquei os dentes esperando o pior. Acordei em uma praia deserta, quilômetros e quilômetros para cada lado, sem sequer pegadas de gente. Entrei em desespero. deveria correr o máximo que pudesse, esperar, gritar? Decidi correr, correr em busca de alguém, odiava a solidão. Corri, minhas pernas desmancharam depois da décima curva. O sangue gorgolejava na areia e virava ácido a dissolver minha pele. Urrando em dor, pude ver cobras brotarem de onde antes estiveram minhas pernas e se prepararem para o bote. A primeira atacou meu pênis, das bolas surgiram asas e ele voou para longe. Caralho de asa!, gritei. A outra avançou contra meus olhos. Foi a última coisa que vi. Gritei no escuro durante horas a fio. Minha visão tornou após alguns dias, pelas minhas contas absurdas. Estava em um buraco no chão, forrado de veludo por dentro. Uma mão apareceu e me puxou de lá, e eu senti como se pesasse diversas toneladas. Ainda zonzo, arranquei o garrote do braço. Risadas ao redor. Percebi que outras pessoas estavam sendo puxadas de seus buracos forrados de veludo e vi no rosto delas como deveria estar o meu nesse momento. Gargalhei. E pronunciei a única coisa que veio à mente. Um puta-que-o-pariu bem espaçado.

28 de jun. de 2010

Quando eu tinha noventa e dois anos, com medo da inevitável chegada da morte, eu fechei meus olhos para não ver o que se estendia à minha frente e acabei vendo o lado de dentro das minhas pálpebras. Hoje eu tenho vinte e três, e acabei por perceber que, mesmo depois de várias décadas tentando olhar para trás, eu ainda não deixei de temer o que me espera.

26 de abr. de 2010

Se, no âmago do ser
Amargo que sou,
Ainda bate um coração,
Pela amada,
Rebato eu:
-Com razão bates.

28 de mar. de 2010

Acorda
Finge, ressona
Um olho no gato
Outro no peixe
Frito na brasa
A batata do almoço
Amanteigada
Levo meu naco
Adeus

Lê na bancada
Minhas derradeiras letras
A linha torta, escrita a carvão
A batata d'ouro ainda brilha no prato
Chora
Espolia suas lágrimas
Soluça, ela
Solitária

Só de roupas de baixo
Levanta
Caminha à porta, rebola
Alvo o colo
À luz da lua
Seduz
Me chama
Seu canto ecoa
Ribomba nas pedras
Do desfiladeiro
Distante, onde moro

E na minha caverna, sonar dos morcegos
Ainda queima a fogueira
Dançam as chamas
Amarelo
Vermelho
Em meio à quentura
Desfila, bem nua
Nobre silhueta
Da dama mais pura

Molho meu rosto
Tento acordar
Mas me prende ao devaneio
O mais lindo olhar
Cheiro das ancas
Preto o cabelo
O jeito de andar

Pausa
Ventrículo estático
Nacarada pele
Palidez irresoluta
Sudorese noturna
Taquicardia
Rigidez matinal

Acordo
Vazio o lugar
Na minha cabeça
Inda pulula
O mais límpido cantar
Dos seios brancos à janela
Daquela
Que vive lá
Depois das montanhas
Naquele lugar

Donde vim
E não mais quis voltar
Por mais frugal que fosse o amor à cama
Algia crural

Agora novamente me invoca
À esplendorosa toca
Mulher-bicho
Bicho-homem
Selvagem local
A batata ainda à mesa
O peixe, ainda presa
Cheiro de brasa

Oi, eu digo
Voltaste, diz ela
E não mais se fala
Só uivos à meia-noite

23 de mar. de 2010

Nunca subestime o amor...

Quase sempre você o conhece franzino, pequeno, o amor, e não o vê crescer e ficar maior, se agigantando no teu peito... o amor.

No começo, de tantos outros sentimentos, calor, alegria, êxtase, amizade, camaradagem, ternura, carinho, paixão, nervosismo, medo, aflição, dor, insegurança, felicidade, ganância, abatimento, afeição, bravura, bom-humor, brio, carência, ressentimento, fraqueza, gentileza, graça, frustração, harmonia, gula, imperfeição, inconstância, vergonha, virtuosidade, necessidade, ousadia, orgulho, luto, loucura, mágoa, amor, vivacidade, volúpia, união, tristeza, covardia, teimosia, ódio, solidão, incredulidade, lealdade, sensatez, sensualidade, safadeza, força, fidelidade, fingimento, amargura, dentre tantos e tantos sentimentos de que dispõe a língua, ele é aquele que não se consegue notar a princípio...

Dentre tantos sentimentos coloridos, ele se camufla, monocromático...

E então, aos poquinhos, ele vai aparecendo, se destacando... de tal forma que, em algumas ocasiões, até não notá-lo no que você mesmo escreve se torna difícil (pule algumas partes caso se entedie):

"Nunca subestime o amor... Quase sempre você o conhece franzino, pequeno, o amor, e não o vê crescer e ficar maior, se agigantando no teu peito... o amor. No começo, de tantos outros sentimentos, calor, alegria, êxtase, amizade, camaradagem, ternura, carinho, paixão, nervosismo, medo, aflição, dor, insegurança, felicidade, ganância, abatimento, afeição, bravura, bom-humor, brio, carência, ressentimento, fraqueza, gentileza, graça, frustração, harmonia, gula, imperfeição, inconstância, vergonha, virtuosidade, necessidade, ousadia, orgulho, luto, loucura, mágoa, amor, vivacidade, volúpia, união, tristeza, covardia, teimosia, ódio, solidão, incredulidade, lealdade, sensatez, sensualidade, safadeza, força, fidelidade, fingimento, amargura, dentre tantos e tantos sentimentos de que dispõe a língua, ele é aquele que não se consegue notar a princípio... Dentre tantos sentimentos coloridos, ele se camufla, monocromático... E então, aos poquinhos, ele vai aparecendo, se destacando... de tal forma que, em algumas ocasiões até ler o que você mesmo escreve se torna difícil."

ZzZZzZzZZzZZZZzZzZZzZZamorZZzZZzZZzZZzZZZzzzZZZzZzzZZamorZzZZzzamorZzZZzZZZZZzZZZZZzZZamorzZZzZZZzzZZZZzZZamorZzzZZamorZzzZZamorZzZamorZzamorZamorZamoramoramoramoramor
Dormir torna-se impossível. Escrever, idem. Eis meu último texto:

"
- Que há contigo?
- Slieá, umtlaemntie sa caioss pceraem mu ttnao ehlbaardaams an mhnia mtnee. Ãno csgonio ecvsreer.
- Que merda, hein."

Até o bendito dia que você nota que tem algo estranho com você. Não por acaso, começa a esquecer o lugar onde pôs as coisas, compromissos importantes, seu nome e endereço. Sua agenda começa a ter dias reservados para compromissos mais importantes que os mais importantes dos mais importantes. E você percebe que não é mais você. O dia muda, o semblante muda, o telefone muda, a conta bancária muda e o mais importante: seus planos mudam. Porque agora você não é mais só um ou você. Contrariando a matemática e o português, você agora é nós dois.

O amor. Aquela coisinha insignificante de quatro letras finalmente acaba por ocupar tua cabeça. E você conta as horas, os minutos, os segundos e os milésimos para estar com quem ama. E dois anos depois, ainda consegue encher uma página ou duas de palavras, tentando explicar apenas uma. Amor.

(Mesmo sabendo que já existe alguém pra te explicar, bem direitinho).




Dois anos tentando explicar o inexplicável. Te amo, vocesabequem.

15 de mar. de 2010

- Que há contigo?
- Slieá, umtlaemntie sa caioss pceraem mu ttnao ehlbaardaams an mhnia mtnee. Ãno csgonio ecvsreer.
- Que merda, hein.

20 de jan. de 2010

Cala
Que eu falo
Chama
Eu vou
Leva
Que eu busco
Fala
Eu escuto
Solta
Eu seguro
Afrouxa
Que eu aperto
Falta
Eu completo
Sofre
Acalento
Esfria
Eu esquento
Cala essa chama
Leva essa fala solta
Afrouxa essa falta
Sofre e esfria
Eu falo e vou
Escuto
Busco
Seguro e aperto
Completo, acalento
Esquento
Não sofre, que eu te acalento e escuto
E busco o que falta, e te completo
Aperta meu falo, que é chama
Que não afrouxa nem esfria,
E te esquento,
Não me solta, que eu, seguro, te aperto
Não cala,
Fala e me leva,
Que eu vou.

18 de jan. de 2010

Por que me ligas a essa hora Gisela? meus olhos já estão baixos de sono, mas não consigo dormir, e o café esfriou faz um quarto de hora, precisamente, não, eu não tenho aqueles comprimidos que você me pediu semana passada, ultimamente só tenho usado morfina e nem aquele punhado de ampolas que tomei nesse mês surtiram efeito nessa monotonia linguística que anda o meu cérebro, verdade que viajei a couple of times, baby, mas não quero isso pra mim, isso vicia pra caralho, sabe eu tô realmente é precisando desligar essa bosta dessa massa cinzenta na gaveta do meu crânio, insônia filha da puta que me persegue, mas enfim não adianta dissertar isso pelo telefone, né, sim eu sei que você também tá fodida, teu homem te chifrou de novo? me conta uma novidade, se esforça um pouquinho, eu sei que você consegue, deixa eu te dizer, surgiu uma oportunidade aí, uma galera tá querendo me levar pra Porto Alegre, dizem que vai rolar uma nota preta e pá, eu poderia pensar em pelo menos mil maneiras de torrar essa grana, mas vou sentir tua falta sabe? claro que eu te amo, Gi, mas negócios são negócios, você conhece aquelas baboseiras de ditado popular, amizade à parte né e tal, enfim, deixa eu aproveitar que ligaste pra te perguntar da minha namorada, cê tá cuidando dela direitinho? tu passou aquele dinheiro que mandei pra ela? tá, acredito sim, é eu sei, criatura, que ela fica naquela metalinguagem corporal, o umbigo maior que o mundo ao redor dela, eu sei, relaxe que eu cuido disso depois, mas você precisa fazer um favor pra mim, na verdade, precisas ser eu nesse momento e dar o cano nela por mim, fazes isso? porra Gisela, é um nadinha, a gente já vem se fudendo, eu-e-ela, faz um bom tempo já, só continuo mandando essa mesada por que eu sei que eu fodi ela mais que o mundo todo junto e a gente usou a mesma escova por uns tempos, eu sei que ela tá mal, cacete, mas que se dane, o Rio Grande me espera, não posso carregar esse fardo o resto da vida, além do mais eu avisei que ela ia se foder bonito usando essas coisas, ela não é mais nenhuma menina, vamo falar a verdade, joga as cartas na mesa com ela, manda ela se foder, tomar no centro da pastilha, e se ela ainda chiar, você acende o cigarro e dá as costas, pode dar os cenzinho dela e mandar ela plantar batatas na casa do caralho, valeu? como assim, você não vai fazer isso? ta com pena da putinha? ou tu já cansou de dar pra mim também? pro caralho com esse teu homem, Gisela! o filha da puta lambuza o pau em tudo que é porra de doença e depois te fode na normalidade, não te dá um pingo de atenção e você ainda ama o cara? ah, foda-se você também, tu merece é uma cambada de pau mesmo, porra, tá, vamo parar com essa merda, eu gosto muito de você, vamo fazer o seguinte, a gente fode amanhã, eu te entrego o remedinho que você me pediu e tá tudo certo, ein? você dá o chute na vaca por mim e eu arrumo quem detone esse veado que te desrespeita, ok? não Gi, não chora, por favor, escuta eu preciso desligar, vem chegando um cara que caiu da moto, tá na merda o coitado, amanhã de tarde eu te ligo, dorme bem, e vê se não exagera nas pílulas pra dormir, caralho, tu lembra o que aconteceu da última vez né? não se mata até amanhã, te amo, tchau.